Nos prefácios de Sena tenho tido oportunidade de o conhecer melhor não só como autor, mas também como pessoa.
Nos seus prefácios Sena chega a escrever em tom confessional, revelando as suas crenças mais profundas. Uma revelação tão ou mais inesperada, considerando a privacidade que advocava, no entanto a vontade de comunicar com os seus leitores era suprema:
Religiosamente falando, posso dizer que sou católico mas não um cristão — o que apenas significa que respeito na Igreja Católica todo o velho paganismo que conservou nos rituais, nos dogmas, etc., sob vários disfarces, tal como a Reforma protestante não soube fazer.
Acredito que os deuses existem abaixo do Uno, mas neste Uno não acredito porque sou ateu. Contudo, um ateu que, de uma maneira de certo modo hegeliana, pôs a sua vida e o seu destino nas mãos desse Deus cuja existência ou não-existência são a mesma coisa sem sentido.
Filosoficamente, sou um marxista para quem a ciência moderna apagou qualquer antinomia entre os antiquados conceitos de matéria e espírito.
Mas, politicamente, sou contra qualquer espécie de ditadura (quer das maiorias, quer de minorias), e em favor da democracia representativa. Nāo tenho quaisquer ilusões acerca desta — pode ser uma máscara para o mais impiedoso dos imperialismos. Mas isso também o podem ser outros sistemas.
Sou a favor da paz e do entendimento entre as nações, e espero que o socialismo prevalecerá em toda a parte, mantendo todas as liberdades e a democracia representativa.
Não subscrevo a divisão do mundo em Bons e Maus, entre Deus e o Diabo (estejam de cada lado estiverem). Apesar da minha formação hegeliana e marxista, ou tambėm por causa dela, os contrários são para mim mais complexos do que a aceitação oportunista de maniqueísmos simplistas.