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Na época, Dostoiévski era um estudante na Academia de Engenharia Militar em São Petersburgo. Uma carreira de engenheiro militar decidida pelo pai.
Claramente que Dostoiévski era inadequado para tal ocupação. Ele e o seu irmão mais velho Mikhail, que permaneceu como seu amigo íntimo, tornando-se o seu colaborador na publicação de revistas, ficaram encantados pela literatura desde a sua juventude.
Desde criança e como estudante, Dostoiévski sentiu-se atraído pela ficção romântica e gótica, especialmente pela obra de Sir Walter Scott, Ann Radcliffe, Nikolay Karamzin, Friedrich Schiller e Aleksandr Pushkin.
Pouco tempo depois de se graduar (1843) e de se tornar subtenente, Dostoiévski demite-se da sua comissão para começar uma carreira arriscada como escritor, vivendo da sua pena.
Traduzido do inglês www.britannica.com
O senhor é quase invulnerável no aspecto legal e esse será o primeiro ponto que lhe farão notar, com ironia. Haverá mal-entendidos. Quem compreenderá os verdadeiros motivos dessa confissão? Ninguém os quererá ver, porque se temem semelhantes actos, olham-nos com desconfiança; são provocadores de ódios e vinganças, porque o mundo gosta da sua iniquidade mas não admite que lha mostre. Eis a razão por que se hão-de apressar a meter tudo a ridículo, pois é pelo ridículo que tudo matam mais rapidamente. (...)
É claro que, de começo, ficarão horrorizados, porém, mais à superfície que no fundo, e isto para guardar as conveniências. Não das almas puras, porque essas se horrorizarão interiormente e se acusarão a si mesmas; mas ninguém o saberá, porque sabem conservar-se em silêncio. Os outros, as pessoas da sociedade, não temem senão o que lhes ameaça os interesses. Esses é que se apressarão a rir, depois do primeiro movimento de surpresa e revolta convencional.
Fiódor Dostoiévski-Os Demónios
Apesar de já ter acabado de ler Os Demónios há uns dias, ele continua a exercer sobre mim uma atracção fatal.
Esqueci-me de referir que existe um capítulo d'Os Demónios que nunca foi publicado.
O autor tinha-o pronto a publicar nas Notícias de Moscovo, mas, segundo conta Strakov, o editor desse jornal conservador, N. Katov, não quis imprimir a confissão dos desregramentos de Stavroguine. No entanto, sabe-se que Dostoiévski leu o capítulo a várias pessoas.
Nicolau Stavroguine é uma das, se não a mais, fascinante deste livro.
Durante todo o livro Nicolau Stavroguine está envolto numa névoa de encantamento maléfico. Não conseguimos perceber muito bem quais são as suas motivações e quem de facto é, como homem. Sentimos que há algo nele que não é humano. O seu silêncio e o seu olhar transmitem um incómodo sobrenatural, uma energia sombria e todos lhe parecem obedecer sem que ele verbalize nenhum pedido.
Neste capítulo não publicado Nicolau Stavroguine confessa-se:
Não sei ao certo se sou eu mesmo o Demónio.
E revela a sua natureza:
Senti no mesmo instante que praticava uma vileza, mas experimentei ao mesmo tempo certo prazer; como um ferro em brasa, ardia em mim um sentimento novo que me absorveu logo. Devo dizer que muitos maus sentimentos me invadiam com frequência, a ponto de me fazerem perder a razão, ou melhor, de me tornarem extremamente obstinado, mas nunca até ao esquecimento de mim próprio. (...)
Enquanto tomava chá e conversava com eles, cheguei à seguinte conclusão: não distingo o bem do mal e não só essas noções não existem para mim - com o que me alegro -, como as considero um preconceito.
E o conselho que recebe após esta confissão é:
Humillhe o seu orgulho e o seu demónio! Assim, será vencedor e recuperará a liberdade.
Se não fosse este capítulo, teria acabado de ler o livro sem nunca ter encarado Nicolau Stavroguine como ser humano. Ser humano são estas dúvidas, este reconhecimento da maldade e não saber o que fazer com ela. É a coragem da confissão, sem cinismo, mas de coração aberto, como nunca o tinha sido em todas as páginas que li.
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