Não admira nada que os homens hajam encontrado a escravidão em vez da liberdade e que em lugar de servirem a fraternidade e a união tenham caído na desunião e no isolamento (...). Que será desse prisioneiro das inúmeras necessidades que ele mesmo inventou? (...) Os bens materiais, no fim de contas, aumentaram - mas a alegria diminuiu.
Fotografar leitores que lêem durante as suas viagens de metro em Nova Iorque foi uma ideia que se concretizou num projecto fotográfico.
Pergunto-me se os leitores do submundo, que viajam pela escuridão, encontram a luz nas páginas dos livros que transportam. E porquê fotografar leitores? O que revelam eles no olhar que valerá a pena ser fotografado? Estará a leitura a transformar-se num acto humano tão raro que fotografá-lo seria uma maneira de o registar para a posteridade? Ou será a leitura um acto humano que revela apenas quem somos?
Afirma-se que o mundo, abreviando as distâncias, transmitindo o pensamento pelos ares, se unirá mais e reinará a fraternidade. Desgraçadamente, não acredito nessa união dos homens. Idealizando a liberdade como um aumento de necessidades e sua pronta satisfação, alteram a sua natureza, pois fazem que neles surja uma porção de desejos insensatos, de hábitos e fantasias absurdas. Vivem só para se invejarem mutuamente, para a sensualidade e ostentação.
Presentemente, cada qual aspira a separar dos outros a sua personalidade, cada um pretende gozar a plenitude da vida. Entretanto, longe de atingir esse fim, todos os esforços dos homens se dirigem unicamente para um suicídio total: em vez de afirmarem toda a sua personalidade, caem em completa solidão. De facto, neste século, todos se sentem fraccionados em unidades, todos se isolam no seu buraco, afastando-se uns dos outros, escondendo-se, a si e aos seus bens.
Sempre que viajo, ao meu lado sentam-se as personagens do livro que me acompanha. Vamos em amena cavaqueira até ao destino, que raramente o é, apenas um ponto de passagem entre um capítulo e outro.
E em tantas idas e voltas vivo reviravoltas, embalada por páginas de aquém e além mar.