O «clássico», o «obrigatório» Pushkin pode decepcionar os amantes de clássicos sumptuosos e difíceis. Sem ser uma «leitura fácil», lê-se facilmente.
É bom falar com ele, às vezes mais do que com alguém de carne e osso. Pushkin estabelece um óptimo contacto com o leitor.
Compreensível, transparente e fascinante, é mais acessível para o leitor do que muitos dos escritores naturalistas nossos contemporâneos.
É aberto, não se esconde por trás de conceitos herméticos nem frases sofisticadas.
Como interlocutor, é muito bem formado: não aborrece com sermões, não humilha com altivez, não faz o leitor sentir-se um pobre de espírito perante uma agressiva erudição de grande homem.
Conta histórias, palra, brinca, trata-nos com respeito e simpatia. Cumprimenta, pergunta pela saúde da família.
Acusá-lo de elitista é injusto.
Introdução de Nina e Filipe Gerra, n'O Cavaleiro de Bronze e Outros Poemas de Aleksandr Pushkin
Foi o poeta Aleksandr Blok quem, num memorável discurso pronunciado aos pés da estátua do poeta em 1921, saudou em Pushkin um «mestre da liberdade», para além dos seus paradoxos de homem social e das suas contradições políticas.
Introdução de Nina e Filipe Gerra, n'O Cavaleiro de Bronze e Outros Poemas de Aleksandr Pushkin
Liberto do regime rigoroso do liceu, o poeta compensa os anos de reclusão escandalizando toda a gente com as suas aventuras amorosas e provocando a irritação das autoridades com as suas poesias satíricas e epigramas atrevidos, em que não poupa até o czar Alexandre I. (...)
O czar decide castigar o ousado poeta.
Por obra de amigos influentes Pushkin não é preso nem exilado, apenas transferido do seu modesto serviço no Ministério dos Negócios Estrangeiros para o Sul do país.
[Em 1824 foi exilado] para a província de Pskov, aldeia de Mikháilovskoe, sem o direito de abandonar o local. Pushkin sofreu aqui um verdadeiro isolamento, durante dois anos, até à morte de Alexandre I.
O novo czar, Nicolau I, manda-o logo regressar a Petersburgo e a vida do poeta muda radicalmente.
Nicolau recebe Pushkin. (...)
[E diz-lhe:] «Doravante serei eu o teu único censor.»
O que cumpriu, literalmente.
O poeta ficou livre, mas não tanto.
Podia deslocar-se livremente, mas tinha de informar as autoridades. Continuava vigiado, quer nas suas deslocações, quer na apreciação da lealdade política dos seus escritos.
Um polaco russificado, Bulgárin, também escritor, era um dos seus mais vigilantes e violentos inimigos, cumprindo também a tarefa oficiosa de examinar previamente os escritos de Pushkin.
Esta tutela policial e ideológica explica a persistência com que o escritor lutou pela independência económica dos seus pares, pela protecção dos direitos de autor, pela edição de uma revista literária dirigida por ele.
Introdução de Nina e Filipe Gerra, n'O Cavaleiro de Bronze e Outros Poemas de Aleksandr Pushkin