O nosso interno tinha o hábito de parar junto de cada doente e de o interrogar com um ar muito sério e muito atento antes de lhe receitar a dieta e os remédios.
Algumas vezes percebia que o «doente» não tinha nada, mas, mesmo assim, deixava-o ficar.
Compreendia que o infeliz fora ali para repousar da corveia ou dormir num colchão em vez de numa tábua nua, numa enfermaria quente em vez de numa casa da guarda húmida, onde amontoam em magote arguidos macilentos e descarnados.
O nosso interno inscrevia, pois, o falso doente, sem hesitar, declarava-o atacado de febris catharralis e depois deixava-o, por vezes, gozar uma boa semana de férias.
Sabia-se muito bem que, por acordo tácito entre médico e paciente, tal fórmula designava uma doença fingida, a «cólica de ocasião», como diziam os forçados.
Enquanto esteve preso, para além dos seus ataques de epilepsia, Dostoiévski perdeu muito peso e foi acometido por febres, que o levaram a ser internado ocasionalmente no hospital militar.
Cantavam-na muitas vezes, mas em solo e não em coro.
Nas horas de descanso, um forçado sentava-se à porta da caserna, pensativo, com o rosto entre as mãos, e entoava esta melopeia em tom elevado, de falsete. A tristeza que emanava dela dilacerava-nos a alma.
Quanto mais o homem foi aviltado, tanto mais se apruma e se aplica a provocar o terror, e folga com esse terror, com a repugnância que inspira aos outros.