Relativamente à evolução de Hamsun como escritor, é muito mais difícil de descrever o seu percurso evolutivo. Ao contrário de praticamente todos os outros escritores que já viveram, Hamsun parece ter surgido totalmente formado, livre de qualquer tradição literária definível, ou mesmo influências explícitas.
Após um longo período de tempo a escrever juvenilia, Hamsun levantou a sua voz aos trinta e poucos anos - e era diferente de qualquer outra que se tinha feito ouvir.
Segundo Hamsun, a escrita daquele tempo era dominada por volumes com enredos laboriosos cheios de conversa fiada e prosa artificial que continha pouca profundidade psicológica e emocional. Hamsun revoltou-se contra todas essas convenções, tornando-se no líder da revolta neo-romântica no virar do século, resgatando o romance da tendência do naturalismo excessivo.
Utilizando um estilo simultaneamente cortante e surpreendentemente lírico, escreveu pequenas histórias, muitas vezes na primeira pessoa, baseadas menos em acções, e mais focadas nas maquinações complicadas, contraditórias e muitas vezes brutais da mente e do coração humanos.
O resultado foi uma série de romances "psicológicos" de tirar o fôlego, que surpreenderam tanto os críticos como os leitores.
Pesquisa, adaptação e tradução livre do inglês de www.theguardian.com e www.britannica.com
Knut Hamsun, pseudónimo de Knut Pedersen (nascido a 4 de Agosto de 1859, Lom, Noruega - faleceu a 19 de Fevereiro de 1952, perto de Grimstad), romancista, dramaturgo e poeta norueguês, vencedor do Prémio Nobel da Literatura em 1920.
Nascido pobre na Noruega rural, Hamsun passou a maior parte da sua infância no remoto Hamarøy, condado de Nordland, e praticamente não teve educação formal. Autodidacta, sem qualquer base social ou intelectual, como outros literati europeus daquele tempo, começou a escrever aos 19 anos, quando era aprendiz de sapateiro em Bodø, no norte da Noruega.
Pesquisa, adaptação e tradução livre do inglês de www.theguardian.com e www.britannica.com
Um conto em particular desta colectânea de contos - O Cocheiro da Morte -, que me andou a profanar as vísceras, a violar o meu segredo, a transgredir-me, arrombando as crenças que me contaram, devassando as raízes que me sustentam, sussurando-me a verdade que sempre neguei por não conhecer outra.
Um conto que detestei ler desde o seu início, que abandonei a meio, que retomei e abandonei outra vez, que recusei ler, com quem batalhei.
É sempre assim com histórias que vão aniquilar vazios que pensei estarem cheios, que vão crua e desumanamente contar aquilo que não quero ler, destruindo partes de mim que irão renascer numa outra dimensão.
Nas suas últimas páginas não o quis abandonar, retardando a sua leitura para não chegar ao seu fim, que criou um novo início em mim.
Fiquei sem saber o que dizer sobre este silêncio de abandono em que ele me deixou.
Em breve virá a manhã do primeiro dia do ano, David, e, ao acordarem, o primeiro pensamento dos homens será para o novo ano; pensarão em tudo o que esperam e desejam que este ano lhes traga e depois pensarão no futuro. E o que eu queria era poder aconselhá-los a não pedirem nem a felicidade do amor, nem o sucesso, nem a riqueza ou a longa vida, nem sequer a saúde. Não, que se limitem a juntar as mãos e a concentrar as ideias num único pedido: «Senhor, fazei com que a minha alma alcance a maturidade antes de ser ceifada!»
-Eu sou a força que tem poder sobre os filhos dos homens - responde o cocheiro, e a sua voz torna-se grave. -Vou incomodá-los, quer morem em casas altas ou em caves miseráveis. Dou a liberdade aos escravos e arranco os reis dos seus tronos. Não há fortaleza suficientemente poderosa para que eu não lhe possa escalar as muralhas. Não há ciência que consiga parar o meu caminho. Atinjo as pessoas que, em segurança, viviam felizes, e dou bens e heranças aos miseráveis que sofreram a pobreza.
Quando um coração está cheio de orgulho, dá o seu amor aos grandes e poderosos do mundo; mas, quando tem apenas humildade e caridade, a quem dar o seu mais ardente amor senão ao mais infeliz, o mais desiludido, o mais desvairado e o mais endurecido?
Estão os dois profundamente tristes. A mulher chora em silêncio e às vezes limpa os olhos com um lenço amachucado. Tem gestos bruscos, como se as lágrimas a impedissem de cumprir um dever. Os olhos do homem estão também vermelhos de emoção, mas não se deixa levar pelo desgosto, porque não está só.