Quando a vida nos atira impiedosamente para a verdade que jaz no chão, nos pontapeia o âmago e nos despe da inutilidade do pensamento que outrora achara útil, entramos em êxtase sofrido, em contentamento descontente camoniano.
Esvaziadas as palavras, um dilúvio de emoção naufraga toda a razão que permanecera à superfície.
Fecha-se a contracapa sobre a solidão, o único recanto onde a verdade reina.
Porque a leitura é sempre um acto pessoal, individual e instransmissível, um livro lido terá a Humanidade inteira nas margens das suas páginas, confiando que a sua travessia a leve aonde quer chegar.
É com uma reverência de princesa que agradeço à Magda Pais do StoneArt Portugal o email, qual missiva real, de que fui nomeada para os Sapos do Ano 2017.
Fiquei incrédula!
Nem sabia que aqui vinham a este canto deleitar-se com a paixão livresca que me assola os dias!
Se é pelos meus livros, tudo vale a pena.
Obrigada a quem me nomeou e à Magda pela iniciativa gira.
Acaso os poetas lacrimejantes
liam já às suas damas amantes
as próprias obras? Sim, e ouvi dizer:
maior recompensa não pode haver.
Ditoso é o amante modesto
lendo os sonhos de que é autor
ao objecto do seu canto e seu amor,
à bela posta em lânguido gesto!
Aleksandr Pushkin-Eugénio Onéguin
Quarto Capítulo
Quem amar então? Confiar em quem?
Afinal quem não nos atraiçoa?
Quem nos julga actos e falas sem
desfavorecer a nossa pessoa?
Quem não diz mal de nós nem calunia,
mas nos cuida com zelo e cortesia?
P'ra quem nossos vícios são coisa pouca?
De quem não nos iremos fartar nunca?
Não busque esse fantasma inutilmente,
não perca tempo nesse esforço vão:
ame a si mesmo de alma e coração,
meu estimado leitor e confidente!
O amor de si próprio é o bom desígnio:
não achará ninguém mais querido e digno.
Aleksandr Pushkin-Eugénio Onéguin
Quarto Capítulo
Então... domine o sentimento - é fatal
que da ingenuidade nasça o mal.
Aleksandr Pushkin-Eugénio Onéguin
Quarto Capítulo
A mulher, quanto menos amor lhe temos,
mais lhe cativamos o coração
e mais facilmente a enredaremos
na trama montada da sedução.
Aleksandr Pushkin-Eugénio Onéguin
Quarto Capítulo
Não, a ninguém mais daria
o coração! É assim que a lei dura
do juízo supremo providencia;
e por vontade dos Céus: sou tua;
toda a minha vida foi a promessa
deste encontro fatal contigo;
Deus mandou-te a mim, com certeza o digo,
para me guardares até que a morte venha...
Já aparecias nos meus sonhos,
já me atormentavam os teus olhos,
já a tua voz era a secreta senha
para entrares na minha alma à espera,
sem nunca te ver já me eras querido.
Não, não era um sonho, era deveras!
Mas entraste pela porta reconheci-te
E, aturdida, com arrepios na pele,
febril, disse para mim: é ele!
Não é verdade que há muito te ouvia?
Que em silêncio me falavas à alma
quando ajudava os pobres, ou rezava
para mitigar a emoção aflita?
E naquela mesma ocasião
não serias tu, querida aparição,
o clarão fazendo do escuro dia,
caindo sobre a minha cabeceira?
Não eras tu, amor, à minha beira,
a dar-me a esperança sussurrada?
Quem és - o meu anjo-da-guarda
ou pérfido demónio tentador?
Resolve a minha inquieta incerteza.
Ou será nada? Só visão aparente
na alma inexperiente e sem defesa
e o destino seja muito diferente...
Não sei! Mas aos teus pés aqui deponho
a partir desta hora o meu destino,
em lágrimas à tua frente; e sonho
com a tua protecção, suplico...
Imagina-me: estou tão sozinha,
Ninguém aqui me compreende,
a mente esgotada como que definha
e vivo calada - é a morte lenta.
Espero-te: com um único olhar
ressuscita-me a esperança esvaída
ou, com censura, ai de mim!, merecida,
mata-me o sonho que ando a sonhar!
Aleksandr Pushkin-Eugénio Onéguin
Terceiro Capítulo
A Carta de Tatiana a Onéguin
Cai a noite; a Lua sentinela
faz a ronda do longínquo firmamento,
e o rouxinol solta o sonoro canto
na escuridão dos ramos, e ela,
no berço da noite que a não embala,
com a ama velha baixinho fala.
Aleksandr Pushkin-Eugénio Onéguin
Terceiro Capítulo
Estrofe XVI