É estar ao lado de um alquimista que tenta reproduzir a pedra filosofal e que, durante as suas tentativas, cria todas estas transmutações extraordinárias, combinando o humano com o divino, obtendo substâncias místicas inesperadas.
Tolstoi paralisa-nos neste fascínio de palavras hipnóticas que nos levam para outros mundos esquecidos.
Mal entrou em casa, agarrou no diário, abandonado havia muito tempo, leu algumas passagens, e escreveu depois o seguinte: «Há dois anos que nada anoto neste diário, e pensava nunca mais me ocupar desta infantilidade. E, contudo, não se tratava de uma infantilidade, mas de uma conversa comigo mesmo, com esse eu verdadeiro que habita em cada um de nós. Durante este tempo, este eu adormeceu e faltava-me alguém com quem dialogar.»
Nesse momento, sentiu o que habitualmente sentia no decorrer de uma caçada, quando tinha de dar o golpe de misericórdia a uma ave ferida: desgosto, piedade e remorso. A ave debate-se e nós sentimos vontade de acabar com ela o mais depressa possível para podermos esquecer.
Nekliudov deixou-a partir e, por um instante, sentiu-se perturbado e envergonhado a tal ponto que chegou mesmo a experimentar repulsa por si próprio. Nesse momento, deveria ter escutado a sua consciência, mas não compreendeu que essa perturbação e essa vergonha eram a manifestação da sua alma ao procurar voltar a si; pelo contrário, pensava que essa perturbação era apenas consequência da sua falta de habilidade, e que era preciso proceder como toda a gente.