Era como se, desde a véspera, o mundo tivesse mudado de eixo e de realidade. As pessoas batiam-se na rua por política, outras eram presas sem razão, o meu tio albergava espanhóis, estes dois estavam evidentemente metidos em coisas que eu nunca sonhara.
E, entretanto, a praia esvaziava-se, quase só nós ainda estávamos ali, diante de um mar que a luz do meio-dia esbranquiçava e era o mesmo do ano passado.
Ler a Correspondência Jorge de Sena e Mécia de Sena «Vita Nuova» (Brasil, 1959-1965) foi uma experiência intimista.
Nem com a leitura dos Diários de Jorge de Sena senti tamanha intimidade como neste livro repleto de cartas de amor.
Aliás, é um diário a quatro mãos que relata a vida de Jorge e Mécia em Portugal e no Brasil à época em que trocaram correspondência.
Publica-se aqui toda a correspondência trocada entre Jorge de Sena e Mécia de Sena, durante o período de seu exílio no Brasil, anos 1959-1965. Este corpus epistolar é constituído por 40 cartas de Jorge de Sena, na sua maioria, bastante extensas e 90 de Mécia de Sena, mais curtas.
«Suspensão» de um amor intenso correspondido, registado sistemática e alternadamente, optou-se, para melhor evidenciar essas características, pela apresentação intercalada das cartas conforme à ordem cronológica de sua escrita.
Em Gato Preto em Campo de Neve Érico Veríssimo observa os Estados Unidos sem o julgar levianamente.
Procura sempre a sua essência e não só a aparência que se revela perante os seus olhos. Há uma pureza no seu olhar que não quer apenas ver, mas também compreender.
A pobreza, o preconceito e a intolerância fazem parte das cores da paisagem, mas Érico observa-as como fazendo parte da condição humana, injustiças sociais que não deveriam ocorrer em lado nenhum do mundo.
Quanto a mim, o que me interessa principalmente em Hollywood é a sua expressão humana, a sua mirabolante função de fábrica de emoções e de divertimentos, as suas largas possibilidades como instrumento de expressão artística, o seu tumultuoso e vário conteúdo da vida.
San Francisco às vezes parece-me uma velha cortesã que se regenerou e que não gosta de falar no passado.
Deste, tirou uma experiência que lhe dá uma sabedoria amável e um jeito corajoso de encarar a realidade de frente, sem falsos pudores mas também sem os exageros sensuais da mocidade.
Sabe, portanto, divertir-se com moderação e decoro e olhar para as fraquezas alheias com um sorriso de indulgência. Vive com gosto e alegria.
Gato Preto em Campo de Neve não é apenas um livro de viagens, onde se registam os principais pontos turísticos e alguns encontros com celebridades.
É muito mais que um simples guia de viajante.
Érico Veríssimo é um contador de histórias intrépido e as pessoas que vai encontrando durante a viagem tornam-se nas personagens das suas histórias, inclusivé ele próprio.
No comboio que me leva à Califórnia, olho os campos atapetados de neve. O céu é dum cinzento esbranquiçado e glacial. Vejo o desfile das casas, das cercas, das árvores mortas... E, de súbito, um gato preto atravessa correndo um tabuleiro de neve de uma brancura imaculada. Fico olhando o quadro fugidio numa fascinação. Sinto que este momento de fria e silenciosa beleza não é gratuito. Um misterioso alguém está procurando dizer-me alguma coisa por meio dessas imagens em negro e branco. Mas quem? Quê?