Paralelamente, Érico viajante fora professor de Literatura Brasileira na Universidade da Califórnia e diretor de assuntos culturais da União Pan Americana em Washington D.C. E, após a viagem a Israel, se torna um dos mais expressivos narradores brasileiros de viagens com um conjunto de quatro narrativas extensas que acompanharam, de maneira simultânea, mas na periferia, as transições de Érico romancista.
in Os olhos do gato: o narrador de viagens Érico Veríssimo por Anita de Moraes
- Na sua maioria, ignoram-nos. Tive ocasião de dizer a muitos políticos: «Foi preciso que Hitler desencadeasse uma guerra na Europa para que os senhores tomassem conhecimento da nossa existência como seres humanos.»
Os homens ficam tomados da nevrose de enriquecer, de ter melhores roupas, melhores casas, maior número de automóveis e de gozos. O dinheiro traz-lhes também a satisfação de muitas vaidades, como a de mando e a de notoriedade.
A corrida para o dinheiro é dramática. Os homens ficam estonteados. Não têm tempo para fazer exames de consciência. O espectáculo da vida - que os jornais, os cinemas, as revistas e a rádio lhes põem todos os dias diante dos olhos e dos ouvidos - vai criando nas pessoas uma espécie de amoralismo que chega às vezes ao imoralismo.
Tenho a impressão de que o termómetro mais seguro para se avaliar o grau de amadurecimento artístico dum povo é o seu teatro. E a América tem um teatro notável. Um teatro de ideias, de problemas, com autores e actores de primeira ordem.
No dia 17 de fevereiro Gilda e eu recebemos um telegrama de Mário (não tínhamos telefone, coisa dificílima naquele tempo), convidando para irmos no dia 20 conhecer Henriqueta Lisboa, que viria a São Paulo e estaria presente na festinha de aniversário da sobrinha dele, em sua casa.
Fomos, e em dado momento eu estava conversando com ele e seu irmão mais velho, Carlos de Moraes Andrade.
Naturalmente ele tinha ficado constrangido por ter tido aquele rompante na porta do Municipal e perguntou risonho se eu o tinha levado a sério, alegando que era simples brincadeira.
Eu fingi que acreditei e ele passou a manifestar muita amargura, dizendo já estar cansado de sofrer injustiças e ser atacado. Eu observei que não tinha razão, porque poucas pessoas eram mais estimadas e admiradas. "Eu é que sei", disse ele bastante amargurado, e seu irmão o apoiou citando um dito popular: "Pimenta não arde no olho do vizinho."
Mário prosseguiu na mesma craveira, dizendo-se convencido de que o intelectual não devia se meter em política, que o recente Congresso lhe tinha ensinado isto e que a partir daquele momento se fecharia na torre de marfim. O que tivesse de dizer como cidadão diria da torre de marfim, não dentro de algum partido ou movimento.
A arte é filha da dor, é filha sempre de algum impedimento vital. Mas o bom, o grande, o livre, o verdadeiro será cantar as dores fatais, as dores profundas, nascidas exatamente desta grandeza de ser e de viver.
O que eu chamo de “Dia Novo” é o dia da vitória da revolução que afinal acabou estourando mesmo. Chegara enfim o tempo em que o povo não tivera capacidade mais pra não se revoltar, se revoltara.
É que de todas aquelas terras felizes, agora tornadas invivíveis, o povo está fugindo.
Onde vão parar?
São estes os que vão parar desocupados nas esquinas das ruas, no parapeito dos viadutos, nos crimes da noite urbana, roubando quando podem, esmolando, matando pra roubar. São os criminosos. Não os criminosos-natos, são os criminosos-feitos.