O Outono chegou. Após uma pequena pausa necessária nas minhas leituras estou de regresso.
A rotina nem sempre permite que viaje para o mundo imaginário dos livros como gostaria. A realidade não deixa de existir, simplesmente porque gosto de escapar para longe dela.
Então, como andam as minhas leituras?
De Jorge de Sena:
continuo a ler Sinais de Fogo e tem sido uma experiêcia agradavelmente inesperada;
continuo a ler Entrevistas 1958-1978, edição de Mécia de Sena e Jorge Fazenda Lourenço
acabei de ler Correspondência Jorge de Sena e Mécia de Sena «Vita Nuova» (Brasil, 1959-1965) com organização de Maria Otília Pereira Lage
De Mário de Andrade:
continuo a ler Poesias Completas I
De Érico Veríssimo:
já nas páginas finais de Gato Preto em Campo de Neve
Muitas vezes perguntamos: que é que nos leva a ler romances?
A nossa necessidade de ler ficção, penso, vem de um desejo de viver mais, de ampliar a órbita individual, de participar de outras vidas e em outros lugares. A leitura nem sempre significa fuga da vida, como queria aquela personagem de Machado de Assis.
As pessoas procuram nos livros de histórias o convívio com outros seres humanos que têm problemas parecidos com os seus; querem ver como as personagens resolvem esses problemas, como se portam em circunstâncias idênticas às que eles, leitores, encontram na vida real.
Em último caso, mesmo que o herói ou heroína não encontrem nenhuma solução para as suas dificuldades, os leitores se consolarão à ideia de que as outras pessoas e não só a eles «acontecem também essas cousas».
Na minha opinião, o artista que se entrega passivamente ao povo, fazendo-lhe todas as vontades, no afã de ser-lhe sempre agradável, corre um risco de destruição irremediável; mas o que despreza esse mesmo público fica sujeito a tornar-se inumano, precioso e isolado da vida e das suas verdades simples.
Querer ver de perto os artistas de cinema pode ser uma preocupação pueril; fátua, versátil e artificial talvez seja Hollywood como cidade; mas Hollywood está longe de ser um tema fútil. Porque esse subúrbio de Los Angeles exerce hoje em dia uma influência profunda e poderosa sobre mais de metade do Mundo.
Quais são, a seu ver, as características da moderna literatura portuguesa que positiva ou negativamente a definem no quadro das modernas literaturas que conhece?
(...) Não creio que a literatura francesa, a espanhola, a inglesa, a norte-americana, a italiana, a alemã, ou a brasileira, tenham, com menos de cinquenta anos, tantos poetas de alta categoria como Portugal possui: se não são conhecidos e estimados, e muitas dessas literaturas gozam de uma celebridade inteiramente em desproporção com a categoria absoluta que será a deles, o mal é das circunstâncias que nunca os propagandearam como as outras culturas sabem fazer, é da mesquinharia da crítica lusitana que, ao dar gato por lebre, desacredita a literatura portuguesa entre as que poderiam interessar-se por ela, e é da herança dolorosa de uma língua encadeada no silêncio de si mesma, e que agora sai dela sobretudo pela importância internacional de que o Brasil se reveste muito justamente.
Excerto da entrevista O Tempo e o Modo, Lisboa, n.º 59, Abril de 1968
in Entrevistas 1958-1978, edição de Mécia de Sena e Jorge Fazenda Lourenço