E o que aconteceria com os outros, os que não escreviam, aqueles a quem não acontecia o que me acontecera a mim: escrever? Sofreriam eles mais ou menos do que eu? Sofreriam diversamente como? Estas perguntas fizeram-me estremecer, e não menos que a comparação desagradável que me lançara naqueles pensamentos.
Era eu diferente dos outros? Estivera, desde sempre, destinado a sê-lo?
Uma das minhas personagens favoritas de Sinais de Fogo é a mais inesperada e surpreendente de todas: Alberto.
Não sendo uma das personagens centrais, nem de longe a mais importante para o desenrolar da narrativa, Alberto é uma personagem misteriosa que salva Jorge e o amigo Luís das garras dos agitadores da ditadura.
Surge como um devaneio apaziguante em pleno caos, reflectindo sobre o mundo e, em particular, sobre a poesia, uma nova paixão revelada ao recém-poeta Jorge que a escreve em impulsos inspiradores em papelinhos que guarda no bolso.
Alberto disserta sobre poesia, dizendo as mais belas palavras sobre esta arte. Declara a poesia como a criação de um mundo diferente, não melhor, nem o mais perfeito, nem um que substitua o nosso mundo. Apenas um mundo que nos permite observar aquilo que deixámos de ver com a vulgaridade do nosso olhar, ampliando a nossa capacidade de conhecimento para além da superfície das coisas.
A poesia permite alterar a dinâmica do pensamento, sem alterar a essência humana, uma forma de não submissão à fatalidade do mundo.