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Abr23
Por umas horas tudo ficava morto neste mundo
E as tardes dos dias em que houvera enterro de gente grande ficavam cheias de horas de morte. Parecia que por ter morrido um homem, por umas horas tudo ficava morto neste mundo.
As árvores, as coisas, pareciam pegadas à terra num ar de eternidade, a luz do sol empalidecia, e os que estavam cá, os que não tinham sido encerrados num caixão, pareciam-me fantasmas de rosto maldoso (porquê maldoso?) e todos os ruídos da vida provocavam em mim a mesma impressão que o barulho de uma pedra tombando num poço muito fundo.
in Horas Vivas: Memórias da Minha Infância (1952) de Natália Nunes