Todo o mal que ela podia fazer-nos se evitava com essa simples abstenção: não olhar
Havia temporadas em que me esquecia da existência dessa raposa da capoeira velha. Mas de outras vezes, quando era obrigada a passar-lhe defronte, evitava olhar para os seus domínios.
Sabia que a manhosa não gostava nada de que olhassem a sua morada. Todo o mal que ela podia fazer-nos se evitava com essa simples abstenção: não olhar.
Apesar disto sempre ia deitando uma olhadelazita pelo canto dos olhos. Isso, na verdade, não era bem olhar e o que ela acima de tudo detestava era que nós mirássemos de frente, sem disfarces.
Essa raposa velhaca passara a ocupar a capoeira desde o dia em que a Cândida Maluca se sentara ali e se pusera a gritar: -Raposa! Raposa! Lá está ela...
Eu não a vi entrar para a capoeira nesse dia mas, o que é certo, é que foi desde então que ela passou a viver lá.
in Horas Vivas: Memórias da Minha Infância (1952) de Natália Nunes