Não é bem uma preocupação com a escola é antes uma preocupação com a vida

Nota-se na sua obra um manifesto interesse pela instituição escolar; é a influência de quem viveu com um professor, metodólogo e investigador do ensino?

Não. O meu marido sempre me dissuadiu de ser professora, porque ele sabia que era uma profissão esgotante, mal compensada.

Não é bem uma preocupação com a escola é antes uma preocupação com a vida; sou alguém que passou pela escola e reflectiu sobre isso. Ainda hoje continuo a reflectir sobre isso embora não pertença à escola, nem ao campo pedagógico. Não sou pedagoga, mas as notícias sobre o que se passa nas escolas vistas através dos familiares, da televisão, interessam-me na medida em que todo o social me preocupa intensamente.

Natália Nunes in A Página da Educação

Eu desejava também ser assim, calma, digna e feliz como a avó

É verdade que a minha natureza contraditória e insatisfeita me trazia, de quando em quando, um aviventar daquela antiga repulsa e aborrecimento que sentia por alguns dos hábitos e procedimentos da minha avó.

Era quase um rancor e, ao mesmo tempo uma amargura, por ver aquela disciplina, aquela serenidade, a satisfação e o conforto tão convictamente aceites e praticados. Porque eu desejava também ser assim, calma, digna e feliz como a avó, ter umas contas de rosário que ficasse a dedilhar até adormecer, um oratório em cima de uma cómoda, cheio de lacinhos e de flores de papel, e umas portas de pau para fechar à noite, de mansinho...

in Autobiografia de uma Mulher Romântica (1955) de Natália Nunes