Da Obra Completa de António Gedeão terminei a leitura do capítulo correspondente a Movimento Pepétuo, a primeira colectânea de poesia publicada pelo poeta.
Não há como negar a grande musicalidade dos poemas e o profundo humanismo que se exala de cada verso. A simplicidade das palavras transforma-se numa pureza que toca o mais empedernido coração do ser humano.
O tírulo Movimento Perpétuo assinala a fugacidade do tempo, a mudança e a perpétua dor existencial, em suma as mesmas inquietações que dominaram outros poetas da época de 50.
Venho da terra assombrada, do ventre de minha mãe; não pretendo roubar nada nem fazer mal a ninguém.
Só quero o que me é devido por me trazerem aqui, que eu nem sequer fui ouvido no acto de que nasci.
Trago boca para comer e olhos para desejar. Com licença, quero passar, tenho pressa de viver. Com licença! Com licença! Que a vida é água a correr. Venho do fundo do tempo; não tenho tempo a perder.
Minha barca aparelhada solta o pano rumo ao norte; meu desejo é passaporte para a fronteira fechada. Não há ventos que não prestem nem marés que não convenham, nem forças que me molestem, correntes que me detenham.
Quero eu e a Natureza, que a Natureza sou eu, e as forças da Natureza nunca ninguém as venceu.
Com licença! Com licença! Que a barca se fez ao mar. Não há poder que me vença. Mesmo morto hei-de passar. Com licença! Com licença! Com rumo à estrela polar.
Poema Fala do Homem Nascido in Teatro do Mundo 1958