Ciclo de Leitura| Fiódor Dostoiévski
Tudo sobre: Fiódor Dostoiévski
Recordações da Casa dos Mortos
Gente Pobre
Novelas/Contos:
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Tudo sobre: Fiódor Dostoiévski
Recordações da Casa dos Mortos
Gente Pobre
Novelas/Contos:
-Mas nesse quarto nem cabe uma cama. É pequeno de mais. Quem pode viver ali?
-Mas para que é preciso que viva? Basta que tenha um canto para dormir, que para viver chega-lhe o parapeito da janela.
O Ladrão Honesto-Fiódor Dostoiévski
No prefácio deste livro Dostoievski alega que se baseou na vida de um outro prisioneiro que deixara, após a sua morte, "um caderno volumoso, coberto de letra fina, mas inacabado, abandonado, sem dúvida, pelo seu autor" com "notas acerca dos trabalhos forçados" que vivera.
Talvez para se defender da censura de outrora, mas é muito claro que Dostoiévski escreve o livro na primeira pessoa, levando-nos com ele naquele sofrimento atroz de clausura.
Este livro é para ser lido no Inverno, num dia chuvoso e triste e não, como eu o fiz erradamente, em dias felizes de sol e mar. A liberdade do mar não é compatível com as correntes, com a tristeza, com a clausura sufocante que este livro transmite.
Senti-me penosamente agrilhoada a este livro e, só hoje o finalizo, após tantos dias de palavras aprisionadas.
Senti como é não ter liberdade, sem, de facto, a perder.
Ser-me-ia impossível dizer-te o que aconteceu à minha alma, às minhas crenças, à minha inteligência e ao meu coração no decurso destes quatro anos. Levaria muito tempo a contar. Mas a permanente concentração em mim mesmo, que me permitiu fugir à amarga realidade, deu os seus frutos. Agora tenho exigências e esperanças em que nem sequer teria pensado.
Carta de 22 de Fevereiro de 1854, dirigida ao irmão
Mas a alma, o coração, o espírito, o que lá cresceu e amadureceu, e o que lá murchou, o que foi rejeitado juntamente com o joio, não se pode transmitir nem descrever num pedaço de papel.
Carta de 30 de Julho de 1854, dirigida ao irmão
Foram forçados que nos libertaram das grilhetas, na oficina de engenharia.
(...)
Os ferros caíram. Endireitei-me. Quis segurá-los nas minhas mãos, olhá-los uma última vez... Estava tão surpreendido de já não os sentir nas pernas!
Fiódor Dostoiévski-Recordações da Casa dos Mortos
E quanta juventude enterrada naquelas muralhas, quantas forças inutilizadas, perdidas ali sem benefício!
Fiódor Dostoiévski-Recordações da Casa dos Mortos
A liberdade, vista da fortaleza, parecia-nos mais livre do que a verdadeira, mais livre do que a liberdade tangível e real. Os forçados viam-na toda carregada de lindas cores, só lhe distinguiam o lado belo, o que é natural nos prisioneiros.
Fiódor Dostoiévski-Recordações da Casa dos Mortos
Omsk é uma feia cidadezinha, quase sem árvores. No Verão, um calor tórrido, vento e poeira; no Inverno, um vento tempestuoso. Não vi o campo. A cidade é suja, militar e dissoluta no mais alto grau.
Carta a 22 de Fevereiro de 1854, dirigida ao irmãoOmsk - a cidade que albergou o campo de trabalhos forçados - agora, no séc. XXI
Imagem www.pinterest.com
Como chegara aos trabalhos forçados no Inverno, deveria ser libertado na mesma estação, no aniversário da minha entrada!
Com quanta impaciência aguardei esse Inverno, com quanta impaciência vi o Verão morrer, as folhas amarelecerem nas árvores, a erva secar na estepe!
Mas o Verão terminou, finalmente, o vento outonal começou a gemer, caiu a primeira neve...
Chegara aquele Inverno tão longamente esperado!
O louco antegozo da liberdade acelerava-me o ritmo do coração, que batia com pancadas violentas, surdas.
E, coisa estranha, quanto mais o tempo passava, quanto mais se aproximava o momento, mais paciente me tornava, mais calmo me sentia.
Fiódor Dostoiévski-Recordações da Casa dos Mortos
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