A cultura não existe para enfeitar a vida, mas sim para a transformar
«A minha mãe só se conseguia concentrar à noite. Recordo-me de acordar às 4 da manhã, ir à sala e
vê-la a escrever. Ficava horas no corredor a espreitá-la. Era uma coisa misteriosa e espantosa. »
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Contra a perigosa «arte de ensinar um povo a não pensar» que é a demagogia, a autora socorre-se dos dizeres de um provérbio africano: «Uma palavra que está sempre na boca transforma-se em
baba. Não queremos continuar a suportar a baba dos slogans.»
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A cultura não é um luxo de privilegiados, mas uma necessidade fundamental de todos os homens e de todas as comunidades. A cultura não existe para enfeitar a vida, mas sim para a transformar para que o homem possa construir e construir-se em consciência, em verdade e liberdade e em justiça. E, se o homem é capaz de criar a revolução, é exatamente porque é capaz de criar cultura. Aliás, porque a própria revolução é um ato de cultura, há sempre «uma profunda unidade entre a liberdade de um povo e a liberdade do intelectual e do artista»
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«Podem dizer que o povo não lê a maior parte dos escritores portugueses. Eu também não. É evidente que a maior parte dos escritores portugueses tem um uso burguês da cultura, que me maça profundamente.»
in Sophia de Mello Breyner Andresen de Isabel Nery