A minha mãe tinha razão
Neste post o café não tem livros a adoçá-lo, mas memórias.
A minha mais forte e recorrente memória de leitura é a minha mãe constantemente a gritar da cozinha "pára de ler, rapariga, que isso faz-te mal".
Sorria sempre quando a ouvia dizer isto, porque era certo e sabido eu estar com um livro na mão.
Teimosamente insatisfeita, vinha pé ante pé, espreitar-me o sono para ter a certeza de que ele não era feito de páginas de insónia, mas de sonhos que voassem para longe daqueles livros feios e pesados que faziam tão mal à vista e aos quereres de uma mulher, que cada vez mais se afastava do matriarcado tradicional.
A minha mãe tinha razão. Ler fez-me mal, não só aos olhos, mas também à alma.
Tornei-me numa míope inconformista e, para mal dos meus pecados, maior o mal que um livro me provocasse, mais o queria ler, maior a descoberta de absurdo do mundo, mais o amor-ódio aos livros crescia.
O descaramento daquelas páginas de me lerem na face, o espanto pela ausência de sentido da existência.
Aos livros, odeio-os de tanto os amar.