Errando, de livraria em livraria.
Não sei que idade teria quando entrei pela primeira vez numa livraria, mas sei que foi pela mão do meu pai. Era o seu passatempo favorito: ir por Lisboa errando, de livraria em livraria.
E eu, tentando acompanhar os seus passos gigantes, corria ao lado dele, enquanto ele me explicava que existiam livrarias que eram «cemitérios de palavras cheias de teias de aranha que se eternizam nos cantos dos móveis».
Outras havia em que «as palavras se envergonhavam e onde poderíamos encontrar de costas voltadas, para que não fossem reconhecidos, Shakespeare e Goethe».
Nalgumas livrarias seríamos bem-vindos, noutras o meu pai sabia que não iria encontrar nada que lhe interessasse e que seríamos observados com ar aborrecido.
Havia ainda outras onde alguns livros gritariam: «Socorro, tirem-me daqui!» Mas todas elas tinham um nome para além do seu nome: o nome do livreiro que lá estava.
A livraria do senhor Vicente, a do senhor Barata, a do senhor Braga, a do senhor Armando, a do senhor Nuno de Cascais. Hoje ainda temos livrarias com nome, ainda que sejam quase todas do "monsieur" Fnac ou Bertrand...