Isto
Não queiras, não perguntes, não esperes.
Isto que passa como vida e tu
medes em dias, horas e minutos,
ou como tempo passa e vais medindo
em rugas e lembranças e em sombrias
e plácidas visões de coisa alguma,
às vezes sorridentes, mas sombrias;
sim: isto, a que dás nomes, que separas
do resto em que surgiu, de que surgiu;
isto, que já não queres, não interrogas,
de que já nada esperas, mas que queres,
por que perguntas sempre, e por que esperas;
isto, que não és tu, nem vai contigo,
nem fica quando vais; em que não pensas,
porque ao medir apenas medes e
nada mais fazes que medir - só isto,
apenas isto, isto unicamente:
não queiras, não perguntes, não esperes,
que o pouco ou muito é tudo o que te resta.
Poema Isto
Fidelidade (1958)
in Poesia II de Jorge de Sena