Jan não só permaneceria em terra, como se fixaria nesse imprevisto apeadeiro
Movimento de navios no rio Douro em 1835 @ pt.wikipedia.org
Sem surpresa, portanto, também Jan escolheu o mar. Talvez contra a vontade dos pais, talvez clandestino. Em 1840 embarca no navio Fanni que o fará acostar pela primeira vez o Porto, numa manhã de Verão.
Nem deveria ter pisado solo português, impedido que estava pelas regras a que as embarcações estrangeiras eram sujeitas. Mas, atraído pela curiosidade ou levado por aquela energia que é dada em demasia às mentes púberes, arriscou sair. Não seriam mais de dois ou três passos a distar entre o solo de madeira da embarcação e o chão de pedra do cais. Mas mudaram-lhe o destino.
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Nada disso podia imaginar o jovem insubordinado de 14 anos que, segundo reza a lenda familiar, acabaria expulso do barco pelo capitão, zangado com as habilidades e excentricidades do garoto. Debaixo de uma pele de animal selvagem, e sem saber falar português, gesticulou o que seria a encenação de uma caça ao urso. Os transeuntes gostaram tanto que foram atirando moedas. Não se sabe se as terá conseguido guardar ou se foi mesmo sovado pelo capitão, enraivecido com o espectáculo que encontrou de regresso ao navio. Sabe-se, sim, que Jan não só permaneceria em terra, como se fixaria nesse imprevisto apeadeiro. Até morrer.
in Sophia de Mello Breyner Andresen de Isabel Nery