A narrativa de viagem é uma conversa cultural entre quem viaja e o lugar aonde chega, uma conversa entre duas culturas. Uma conversa que exige movimento da nossa zona de conforto para o que nos desconforta.
Quando viajamos para um lugar queremos entender o que não conhecemos. Partimos dos nossos preconceitos, dos nossos estereótipos culturais e fazemos um paralelismo constante entre o que é semelhante e o que é diferente, e isso acontece também ao leitor que lê e vê de uma forma imaginária a viagem narrada.
A narrativa de viagem é interdisciplinar, abarca não só a visão pessoal do autor, mas também áreas do conhecimento como história, antropologia, arquitectura e arte.
— Como se explica isso? — pergunta. — Parece que estamos em tempo de paz. Essa gente brinca, canta, dança, vai ao cinema, ri, bebe... como se nada estivesse acontecendo... — Estás acostumada à nossa maneira sul-americana de encarar a vida — respondo. — Somos povos dramáticos. Cultivamos com carinho mórbido as nossas dores e desgraças. Temos um prazer pervertido em escarafunchar nas nossas próprias feridas.
Saímos às dez horas para o calor pesado da noite. Continua a pantomima nas ruas.
É admirável a maneira como esta gente encara a guerra. Não faz drama. Luta, trabalha, mas nos intervalos entre as horas de combate e trabalho, trata de evitar que a lembrança da guerra lhes roa os nervos. Ninguém usa luto. Não há choro nem o bíblico ranger de dentes. No peito de muitos soldados e marinheiros vemos as cores simbólicas das condecorações recebidas.
As viagens existem desde que o ser humano percorre o planeta, portanto não vamos sequer debater a antiguidade deste acto tão humano que é viajar.
Partilhar as andanças pelo mundo e contar o desconhecido foi passando da oralidade para a escrita e, escrever sobre a viagem da qual se regressa é também uma forma de viajar. Seja esse contar real ou fictício, as viagens sempre nos fascinaram pelo seu encanto misterioso do desconhecido
De Marco Polo a Homero, Júlio Verne, Jonathan Swift, José Saramago, García Márquez, Charles Darwin, Rimbaud, Jack Kerouac, Hemingway e Goethe, muitos têm sido os escritores que se dedicaram à narrativa de viagem.
Ao contrário das profecias, o fim do género da narrativa de viagem está longe de ocorrer. Nunca como agora se viajou tanto e hoje em dia coexistem diferentes meios de se narrar as experiências vividas como viajante, não se restringindo exclusivamente ao livro impresso.
A data em que o malogrado d. Juan Ponce de León assentou pé nesta terra de promissão parecia conter em si uma profecia e uma predestinação. Era o dia da Páscoa de Flores, razão pela qual esta região recebeu o nome de Flórida. E hoje este estado do extremo sul dos Estados Unidos é uma espécie de permanente “páscoa das flores”, com suas fantasias aquáticas, seus jogos florais, seus concursos de beleza em que raparigas representantes de todos os estados da União desfilam à sombra de palmeiras, sob um rútilo céu azul, numa exibição de caras, bustos, coxas, pernas... De certo modo se confirmam as lendas dos tempos de Ponce de León.
Miami é uma cidade alegre, plana, limpa, simétrica e colorida. Não tem ladeiras nem ruas tortas, nem casas antigas ou monumentos históricos. De tão nova e clara, parece até cheirar a tinta fresca.