Grande parte da poesia de Gedeão parte de um núcleo de transparência da intenção (reflexo, talvez, do futuro optimismo dos cientistas em geral, que professam ter inventado o futuro da humanidade) a um escurecimento metafísico, como que a sugerir que o pensamento poético deve finalmente amadurecer no sonho, e não no meridional da clareza do escrutínio científico.
O destino de um complexo ato cognitivo está, portanto, a ocorrer.
Excerto de An Introduction to the Poetry of António Gedeão
Em última análise, a poesia de Gedeão desenvolve uma complexa ironia epistemológica, que é particularmente visível naqueles poemas onde ele traz na proximidade disjuntiva a linguagem de verificação que caracteriza as ciências empíricas e a linguagem finamente modulada de significado incorporado na intensidade do transporte metafórico. Ele revela assim uma unidade subjacente, embora não inteiramente neutra, de missão mimética operando em todo o real, em todas as suas formas de manifestação e representação simbólica, apesar da natureza ser ostensivamente divergente dos valores de verdade alcançados pela experimentação científica, por um lado, e pela experiência literária, por outro.
Excerto de An Introduction to the Poetry of António Gedeão
Amo o espaço e o lugar, e as coisas que não falam. O estar ali, o ser de certo modo, o saber-se como é, onde é que está e como, o aguardar sem pressa, e atender-nos da forma necessária.
Serenas em si mesmas, sempre iguais a si próprias, esperam as coisas que o desespero as busque.
Abre-se a porta e o próprio ar nos fala. As cortinas de rede, exactamente aquelas, a cadeira onde a memória está sentada, a mesa, o copo, a chávena, o relógio, o móvel onde alguém permanece encostado sem volume e sem tempo, nós próprios, quando os olhos indignados nas pálpebras se encobrem.
Põe-se a pedra na mão, e a pedra pesa, pesa connosco, forma um corpo inteiro
Fecha-se a mão, e a mão toma-lhe a forma, conhece a pedra, entende-lhe o feitio, sente-a macia ou áspera, e sabe em que lugares. Abre-se a mão, e a mesma pedra avulta.
Se fosse o amor dos homens quando se abrisse a mão já lá não estava.
A [poesia] póstuma que Gedeão escreveu é, na verdade, o corredor metafórico que leva a uma visão unificadora final da experiência. É a expressão paradoxal da consciência intensificada do poeta de que ele é testemunha do cosmos, que por sua vez é informado pela contingência absoluta do seu corpo, dos seus desejos e da sua mortalidade.
A poesia tem a tarefa única de comunicar os ritmos da vida e da morte à medida que são vivenciados ao longo de uma existência finita.
António Gedeão oferece a sobreposição de duas ordens fundamentais e fundamentalmente heterogéneas de vida mental. Por um lado, o universo arcaico e recorrente da experiência poética, por outro, o universo explicativo e metodológico da investigação e verificação científica.
Excerto de An Introduction to the Poetry of António Gedeão
Se com flores se fizeram revoluções que linda revolução daria este canteiro! Quando o clarim do sol toca a matinas ei-las que emergem do nocturno sono e as brandas, tenras hastes se perfilam. Estão fardadas de verde clorofila, botões vermelhos, faixas amarelas, penachos brancos que se balanceiam em mesuras que a aragem determina. É do regulamento ser viçoso quando a seiva crepita nas nervuras e frenética ascende aos altos vértices.
São flores e, como flores, abrem corolas na memória dos homens.
Recorda o homem que no berço adormecia, epiderme de flor num sorriso de flor, e que entre flores correu quando era infante, ébrio de cheiros, abrindo os olhos grandes como flores. Depois, a flor que ela prendeu entre os cabelos, rede de borboletas, armadilha de unguentos, o amor à flor dos lábios, o amor dos lábios desdobrado em flor, a flor na emboscada, comprometida e ingénua, colaborante e alheia, a flor no seu canteiro à espera que a exaltem, que em respeito a violem e em sagrado a venerem.
Flores estupefacientes, droga dos olhos, vício dos sentidos.
Ai flores, ai flores das verdes hastes! A César o que é de César. Às flores o que é das flores.
Especificamente, ele [António Gedeão] oferece a sobreposição de duas ordens fundamentais e fundamentalmente heterogéneas de vida mental.
Por um lado, o universo arcaico e recorrente da experiência poética, por outro, o universo explicativo e metodológico da investigação e verificação científica.
Excerto de An Introduction to the Poetry of António Gedeão