A Noite de Natal era igual todos os anos. Sempre a mesma festa, sempre a mesma ceia, sempre as grandes coroas de azevinho penduradas nas portas, sempre as mesmas histórias.
Mas as coisas tantas vezes repetidas, e as histórias tantas vezes ouvidas pareciam cada ano mais belas e misteriosas.
Baltasar ficou imóvel como se o rosto do outro lhe tivesse batido na cara. Ou como se o rosto do outro de repente fosse o seu rosto. Ou como se, pela primeira vez na sua vida, tivesse visto a cara de outro homem.
O menino Jesus só cresce e se faz homem quando os outros meninos crescem e julgam que se fazem homens. O que, e lá isso é verdade, não acontece a toda a gente, como os meninos terão muito tempo para ver. Mas isso é já outra história, que os meninos aprenderão, sem que ninguém lha conte.
- Disseste que o Manuel não ia ter presentes de Natal porque os pobres não têm presentes.
- Está claro que é verdade. Eu não digo fantasias: não teve presentes, nem árvore do Natal, nem peru recheado, nem rabanadas. Os pobres são os pobres. Têm a pobreza.
As irmãs, vendo isto, cheias de raiva, não tendo estômago para este estilhaçar dos seus corações, desfilaram caladinhas para casa da mãe, confessando a contragosto que é louco quem se opõe às estrelas.