Com poemas de: Viagem; Vaga Música; Mar Absoluto; Elegia 1933-1937; Retrato Natural; Amor em Leonoreta; Doze Nocturnos da Holanda; O Aeronauta; Romanceiro da Inconfidência; Pequeno Oratório de Santa Clara; Canções; Metal Rosicler; Poemas Escritos na Índia; Inéditos.
Com Olhinhos de Gato termino o meu ciclo de leitura de Cecília Meireles.
E termino com esta reflexão poética sobre a dor da perda, a solidão, a morte e o luto, embalada pelas histórias da ama e pelo afecto da avó, pelas brincadeiras infantis, medos, ensinamentos e descobertas no bairro do Estácio, no Rio de Janeiro, onde Cecília passou a sua infância.
Já sinto saudade do seu traço firme e elegante e há momentos em que Olhinhos de Gato ainda chama por mim, para vir brincar e mostrar os vestidinhos das bonecas, as árvores de fruto, as formas das nuvens que desenham castelos no ar e princesas de além-mar.
E como todas essas vidas ainda eram consistentes e limitadas, afrouxou suas moléculas, dispensou qualquer contorno, espraiou-se na fumaça das nuvens, dissipou-se indeterminadamente pelo céu, foi tudo e nada ao mesmo tempo, sem lado de cima, sem lado de baixo, entregue ao campo que há por detrás do mundo, e por onde se rola sem nome, sem figura e sem fim.
Olho para Cecília encolhida em sua poltrona, iluminando a penumbra do canto da sala.
Vejo-a tão menina olhando o solo e descobrindo na madeira floresta e lendas, deslumbrada de azul! Uma ilha cercada de pontes por todos os lados. Pontes para a ternura, pontes para a poesia, pontes para a alma de cada um.
E olhando-a assim, poesia ela mesma, tão alta e tão pura, percebo porque continua a ser a garotinha à procura do eco, correndo por todos os cantos e por todos os deslumbramentos, sem poder recolher o eco da própria voz: nós somos o seu eco, cantamos o seu canto, sem que ela perceba; somos todos um pouco habitantes de sua Ilha de Nanja “onde as crianças brincam com pedrinhas, areia, formigas”. “Solombra”, a última obra de Cecília, quer dizer só sombra. Cecília, para nós, é só luz.
in A última entrevista de Cecília Meireles por Carlos Willian Leite