Ciclo de Leitura | Marina Tsetaeva
Tudo sobre: Marina Tsetaeva
Poetas Russos, antologia de Manuel Seabra
The Penguin Book of Russian Poetry
Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]
Tudo sobre: Marina Tsetaeva
Poetas Russos, antologia de Manuel Seabra
The Penguin Book of Russian Poetry
Ontem, ainda me olhavas de frente,
mas agora sempre torces o olhar!
Ontem, até à hora dos pássaros ficavas comigo
e todos os falcões são agora corvos!
Como sou imbecil, e tu tão sábio,
tu, cheio de vida, eu, como uma estátua.
De todos os tempos, oh, esta feminina queixa:
«Querido, de que sou culpada?»
E de água tem as lágrimas, o sangue
de água, - e lavou-se em sangue e em lágrimas!
O amor não é mãe mas sim madrasta:
não esperes dele juízo nem clemência.
A algum sítio levam os barcos
os amados, os leva o caminho branco...
Há um gemido ao longo da terra:
«Amado meu, de que sou culpada?»
Ainda ontem, deitado aos meus pés,
pensavas que eu era poderosa como a China!
As duas mãos, de súbito, me largaste -
e caiu-me, como uma antiga moeda, a vida!
Marina Tsvetaeva
Excerto in Poetas Russos, antologia de Manuel Seabra
Serguei [o marido] foi preso por espionagem e executado em 1941.
Marina não foi condenada.
Estaline tinha um estranho respeito pelos poetas.
malomil.blogspot.pt
Imagem russianreport.wordpress.com
O poeta Ilya Ehrenburg dela dirá, evocando essa aparição: “Os excelentes versos de Tsvetaeva subsistirão, como subsistirá a sede de viver, o desejo de tudo destruir, a luta de um só contra todos e o amor glorificado pela morte que vagueia.”
malomil.blogspot.pt
Marina refugiou-se no mundo das palavras. E foi pelas palavras que viveu, no fio da navalha, sempre inflexível. O escritor Nicolai Elenev deu dela esta impressão: “Os seus olhos cinzentos eram frios, transparentes, olhos que jamais conheceram o medo, ainda menos a oração ou a submissão.”
malomil.blogspot.pt
À sua voz desalinhada e brilhante aliou, convenientemente para o mito que os russos adoram e alimentam, um destino trágico. Juntou-se, assim, a tantos outros escritores russos. Mas Tsetaeva era dominada por um carácter indómito que sempre namorou o abismo.
Como se formou este carácter? Para tal contribuiu decerto a educação, obra de sua mãe, que propugnava uma postura inflexível no plano dos valores: acima de tudo, em todas as circunstâncias, a dignidade, a coragem e o rigor; inculcou-lhe ainda a convicção de que todo o dinheiro é sujo e de que quem cede à ganância perde a alma. Rememorando a infância, disse-nos: “Era impensável procurar obter a satisfação de qualquer desejo. Bastava que tivéssemos vontade de uma coisa para que ela não nos fosse dada.”
malomil.blogspot.pt
Marina Tsetaeva (1892-1941) é uma luz cintilante que ascendeu ao firmamento da poesia russa. Uma poetisa de extremos:
Pecarei – como peco – como pequei: Com paixão!
Deus deu-me sentidos – todos os cinco!
Poeta da desmesura, sempre disposta a atingir o limite e a ultrapassá-lo. Em certa ocasião, acossada, como quase sempre após 1917, por extrema miséria material e mesmo fome, foi obrigada a deixar as duas filhas num orfanato da Moscovo bolchevique, onde julgou que seriam alimentadas como ela não podia fazer. Mas, por desventura, a mais nova morreu de fome, o que deixou a mãe com um profundo sentimento de culpa. Pouco depois, em poema dedicado a um antigo amante, para dar nota da mútua destruição que o amor produz, descreve-se a si própria como a única responsável:
Acusada de infanticídio.
Cruel e exausta.
E do inferno perguntar-te-ei,
“Minha querida o que te fiz?”
malomil.blogspot.pt
Imagem rolfgross.dreamhosters.com
A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.